Artistas

MEXA

Criado em São Paulo, SP, 2015

O grito apoteótico e os gestos extraordinários decretam a transmutação como destino incontornável. O feitiço da língua provoca o estilhaço fatal, com fragmentos projetados para representar e confundir, para espalhar a memória e celebrar a imaginação. O espelho quebrado em infinitos fractais reflete o mundo como ele é, mas permite reconstruí-lo de muitos outros modos, tornando possível a reinvenção de si e do outro.

A gênese do MEXA está ligada à efervescência do Centro de São Paulo, com suas potências e mazelas. O coletivo — formado por pessoas de diferentes lugares do Brasil, majoritariamente LGBTQIA+ — tem suas raízes nas lutas por direitos humanos e, sobretudo, na transformação subjetiva e material por meio do pensamento crítico e da inventividade artística. Diante de abismos existenciais, o grupo trabalha no enlace entre as experiências radicalmente biográficas e a ebulição coletiva das ruas da cidade, tomando a autoficção e a ação performática como principais ingredientes para sua dramaturgia. Indo e vindo entre diferentes polos, os trabalhos do MEXA são marcados pela transgressão de limites e conjugação de extremos: o absurdo e o corriqueiro, a abundância e a miséria, a alegria voraz e a melancolia profunda, a violência e o afeto, a rua e o museu, a vida e a morte. Suas apresentações, hipnotizantes e arrebatadoras, combinam teatro experimental, música, dança e “palavra-falada” com contatos diretos com o público, abraçando os riscos da mistura, do improviso e das trocas espontâneas. Por meio de diferentes linguagens e estratégias, o coletivo cria situações intensas e imersivas para circular narrativas que emergem entre a dureza da realidade material e o fervor da criação explosiva.

No 38º Panorama, o MEXA apresenta a ação A última ceia (abertura) (2024), desdobramento da peça A última ceia (2024) — ainda inédita no Brasil —, após uma temporada inaugural na Europa. Na obra, um grupo que irá acabar decide encenar seu último espetáculo. Diante do anúncio fatal, a ocasião transforma-se em uma despedida, uma refeição derradeira na qual todos precisam lidar com a iminente dissolução de uma identidade compartilhada e com os efeitos que o ato terá sobre cada um. Ao longo do festim, o coletivo discute que imagem deveria inventar como seu último registro, enquanto realiza sua ceia final no espaço expositivo, junto ao público. No final da performance, toda a estrutura é desmontada, restando apenas as caixas de som, que emitirão os vestígios do jantar e a foto que o MEXA decidiu produzir como sendo sua última imagem. Nessa ficção, cujas ameaças representadas são frequentemente reais, o grupo subverte a conhecida narrativa bíblica retratada por Leonardo Da Vinci — cuja tela empresta o título à peça — para refletir sobre vida, morte, reinvenção e imortalidade. Entre o documentário e a experimentação surrealista, a obra se vale de um momento de alta pressão para abordar os muitos modos de viver e morrer à luz da importância da partilha, da função existencial de um coletivo, e das possibilidades de existir após o fim. Convidado a se servir com o MEXA nesse misto de banquete ritualístico e acerto de contas, o público é arrematado por um êxtase de emoções numa situação da qual ninguém sairá o mesmo.

1/9

(1-9) A última ceia (abertura), 2024, performance, 120’, fotografia e instalação sonora. Coleção dos artistas

performance
criação: Mexa
dramaturgia e direção: João Turchi
performers e co-criadores: Aivan, Alê Tradução, Dourado, Iara Izidoro, Laysa Elias, Lucas Heymanns, Patrícia Borges, Suzy Muniz, Tatiane Arcanjo e Podeserdesligado
desenho de som: Podeserdesligado
arquitetura: Vão
direção de arte e produção: Lu Mugayar
produção executiva: Francesca Tedeschi
figurino: Anuro e Cacau Francisco
desenho de luz: Iara Izidoro
catering: Ateliê Cacá Vicente Gastronomia


instalação
concepção: João Turchi
co-criação, edição e desenho de som: Podeserdesligado
projeto da instalação: Bio Riff e Juliana Bucaretchi
foto: Laysa Elias
consultoria artística: Bárbara Wagner
impressão: Lenticular Brasil

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