Artistas

Mestre Nado

Olinda, PE, 1945

O barro moldado ressoa os mistérios dos quatro elementos: é originado na terra, amaciado com água, consagrado no fogo e ativado pelo ar. O amuleto-instrumento de forma curva e orifícios precisos canta suas formas, vibrando a potência vital da matéria do futuro.

Mestre Nado, como ficou conhecido Aguinaldo da Silva, é um escultor-instrumentista que desenvolve peças cantantes de cerâmica. Sua arte vem da relação íntima que tem com o barro, do qual tira formas diversas e que, em contrapartida, molda a vida do artista. Ainda na infância, Mestre Nado começou modelando brinquedos com argila retirada das margens de rios na Zona da Mata pernambucana. Já adolescente, iniciou o trabalho em olarias, onde aprendeu a produzir quartinhas — como são chamados os vasos de cerâmica com tampa, que mantém seu interior fresco — e filtros de barro. Com o passar do tempo, seu talento e devoção ao ofício levaram-no a aperfeiçoar técnicas tradicionais e inventadas por ele, encontrando misturas e pontos ideais da massa de argila para modelar e suportar o forte calor do forno. Quando iniciou sua produção autoral, Mestre Nado mergulhou em suas memórias para buscar inspiração: os apitos que fazia quando criança com caules de folha de jerimum e coqueiro e a cantoria dos oleiros enquanto trabalhavam. Assim, de uma bolinha oca, nasceu a primeira Flauta Nado — sua versão da ocarina, pequeno instrumento de sopro milenar —, desabrochando um talento singular para infundir o barro com som. No manejo habilidoso da matéria, entre o molde e a queima, sua busca é por novas notas e oitavas com afinações perfeitas, fazendo emergir uma coleção de instrumentos musicais originais. Como ferramentas-ícones universais, remetem tanto à cultura material pré-colombiana quanto a artefatos de um futuro distante. Suas peças possuem diversas variações de forma e, naturalmente, de sonoridade. Há esculturas zoomórficas que aludem a baleias e tamanduás, e outras que lembram conchas e frutas. Há algumas mais simples, com formas sintéticas arredondadas, e outras intrincadas, que parecem amalgamar partes de naturezas distintas. Em comum, essas obras, que na maior parte das vezes também são feitas para ser tocadas, carregam seu estilo inconfundível, num balanço sensível entre a crueza do barro, as soluções ornamentais e a musicalidade experimental. São tanto talismãs feitos do encontro entre terra, água e fogo, quanto dispositivos que, sob a infusão do ar, cantam suas formas, propagando as mais diversas sonoridades.

No 38º Panorama, Mestre Nado apresenta três obras inéditas produzidas especialmente para a exposição. São peças de grande escala — coisa rara na sua produção — que parecem espécies de torres de sopro, remetendo a instrumentos que demandam o emprego do corpo inteiro para ser tocados, como a gaita de foles. Como esculturas, suas formas orgânicas remetem às geometrias espontâneas da natureza, sejam tubérculos ou arquiteturas animais — como as do cupim e do joão-de-barro. Imbuídas de uma vontade totêmica, as obras são construídas por meio da incorporação de diferentes pedaços que, aglomerados, constituem uma estrutura complexa e marcam uma forte presença corpórea.

1/6

(1-3) Vistas da exposição

(4) A forma do som I, da série Esculturas, 2024, argila, 84 x 39 cm. Coleção do artista

(5) A forma do som II, da série Esculturas, 2024, argila, 94 x 33 cm. Coleção do artista

(6) A forma do som III, da série Esculturas, 2024, argila, 75 x 43 cm. Coleção do artista

PT
EN