Araçuaí, MG, 1945
As formas de vida espalham-se pelo mundo manifestando seus calores, esticando seus membros e inventando seus contornos. Bichos e signos sem nome correm, carregando a substância e os sentidos dos três reinos, como testemunhos vivos da força que faz a terra.
As obras de Maria Lira Marques celebram os movimentos da natureza e seus eternos ciclos de transfiguração. Com cerca de cinco décadas de produção, a artista utiliza cerâmica e desenhos feitos com pigmentos naturais sobre papel e pedras para retratar intensos fenômenos naturais e firmar uma rica simbologia. Paisagens minerais, cenas da fauna e da flora, seres elementais e hibridismos diversos se conectam no tempo da criação vital, dando a ver o movimento incessante da vida em expansão e eterna transformação. Desse modo, ela traduz o mistério que nos cerca e nos constitui por meio de uma combinação rara entre elegância, humor e precisão. Sua relação profunda com o Vale do Jequitinhonha — onde nasceu, cresceu e vive até hoje — se reflete na construção de um vocabulário tão amplo quanto coeso, tão simples quanto complexo, e que levanta questões ecológicas e estéticas desde o sertão do Brasil. O calor intenso da região manifesta-se nas cores vibrantes e nos gestos de suas figuras, evidenciando o momento crucial em que as coisas se transmutam em resposta às demandas da vida. Nesse sentido, a artista costura ecos e presenças de sítios arqueológicos, culturas indígenas, comunidades quilombolas e ocupações sucessivas desse território. Entre a revelação espontânea da matéria e a afirmação de sua identidade negra e indígena, seu trabalho também é informado por questões históricas, e sintetiza a resistência e a luta dos povos historicamente oprimidos. Por meio de suas peças, a artista celebra a força e a resiliência das matrizes culturais de sua formação, refletindo sobre o apagamento enfrentado por certas comunidades e reafirmando suas raízes como fonte de inspiração e poder criativo.
No 38º Panorama, Maria Lira Marques apresenta uma série com mais de dez desenhos sobre pedras. Cada peça é marcada por figuras feitas com tons ocres, marrons e amarelos, dando a ver uma ecologia expressiva de plantas e bichos em suas relações entre si e com o meio. É como se os resquícios do calor da terra tivessem impregnado a superfície desses fragmentos minerais, convertendo-os em testemunhos imemoriais sobre os mecanismos pelos quais a vida incorpora e se desenvolve no mundo.
(1-4) Vistas da exposição
(5) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 18 x 43 x 30,5 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(6) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 20 x 34 x 30 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(7) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 15,5 x 48 x 24 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(8) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 24 x 33 x 28 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(9) Sem título, 2024, pigmentos naturais e mica sobre pedra, 12 x 32 x 24,7 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(10) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 26,7 x 26.5 x 17 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(11) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 18 x 47 x 24 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(12) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 12,5 x 38 x 19 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(13) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 13 x 26 x 33 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(14) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 19,5 x 33 x 32.5 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co
(15) Sem título, 2024, pigmentos naturais sobre pedra, 18 x 36 x 27 cm. Cortesia da artista e Gomide&Co