Artistas

Ivan Campos

Rio Branco, AC, 1960

A mata densa e quente revela seus mistérios no entrelaçamento labiríntico das folhas, galhos, troncos, bichos e trechos d’água. Esses elementos se dissolvem uns nos outros, formando uma só massa de calor, num caldeirão orgânico que fervilha a potência das formas de vida e seus jogos ecológicos.

A obra de Ivan Campos te envolve para te engolir: a grandeza da floresta transborda da tela e toma tudo à sua volta, enlaçando o espectador numa teia biológica e espiritual formada por infinitas conexões. Suas pinturas remetem às mirações, em que podemos enxergar as relações planetárias invisíveis, como se um véu tivesse sido levantado para que pudéssemos acessar outras dimensões a partir da natureza mundana. Estudioso da anatomia botânica, seu processo é orientado tanto pela força da intuição, quanto por muita matemática, envolvendo cálculos que dividem os espaços e a distribuição de componentes na tela. Dentro dos parâmetros estabelecidos pelo artista a priori em cada pintura, ele faz um estudo minucioso para encontrar a posição dos seres vivos e suas interações, compondo relações no espaço e batendo muita cabeça para encontrar o equilíbrio entre a vegetação, os animais e o que não se pode ver. É assim que seu trabalho elabora a harmonia no caos de ambientes em constantes disputas. Em suas pinturas, não há espaços vazios, e nada é ocioso, tudo é dinâmico e há potência em todos os cantos. Nesse horror vacui [1] amazônico, cujos temas e motivos são sempre reiterados, enxergamos a seiva vital que perpassa e mobiliza todas as coisas, a pluralidade de formas e agências da mata, e a dança dos seres em comunhão, pactuados num contínuo e eterno estado de transmutação.

No 38º Panorama, o artista apresenta uma tela de dimensões imensas, que traz os principais aspectos de sua obra. A pintura Rebanhos do céu (2008), de sete metros horizontais, que marcou sua trajetória como seu projeto mais desafiador, demorou um ano para ser concluída e demandou longas e aguerridas sessões diárias. Na visão panorâmica que a obra oferece, enxergamos uma selva intrincada, cheia de complexidades, onde tudo está em movimento. Com poucas cores, de modo a manter uma coesão energética, o artista não deixa de sublinhar a mistura, a mística, as profundas camadas e a confusão de escalas e perspectivas que compõem um ecossistema. Por meio de tons esverdeados e azulados, e um traço sensível e dinâmico, o artista constrói um panorama que dá corpo à energia pulsante que forma e desforma tudo que nos cerca.

[1] Termo que, em latim, significa “horror ao vazio”. Refere-se ao recurso artístico em que toda a superfície da tela ou suporte utilizado é preenchida por conteúdo, comumente com riqueza e profundidade de detalhes, de modo a não deixar nenhum espaço vazio ou neutro no campo visual.

1/4

(1-4) Rebanhos do céu, 2008, acrílica sobre tecido, 156 x 629 cm. Acervo da Assembleia Legislativa do Acre (ALEAC)

PT
EN